Quem está pronto para cuidar de verdade?
Saúde mental nas empresas: do discurso à estratégia Nos últimos anos, a saúde mental deixou de ser um tabu e passou a ocupar um espaço central nas discussões corporativas. Está nos relatórios de sustentabilidade, nos comitês de ESG e nas mesas de conversa entre RH, jurídico e lideranças. O tema ganhou força — mas ainda […]

Saúde mental nas empresas: do discurso à estratégia
Nos últimos anos, a saúde mental deixou de ser um tabu e passou a ocupar um espaço central nas discussões corporativas. Está nos relatórios de sustentabilidade, nos comitês de ESG e nas mesas de conversa entre RH, jurídico e lideranças. O tema ganhou força — mas ainda carece de estrutura real para se sustentar no cotidiano das organizações.
Ao longo de nossa atuação com empresas dos setores de energia, indústria, serviços financeiros e setor público, temos mapeado riscos psicossociais, conduzido escutas qualificadas com lideranças e times técnicos e apoiado a construção de estratégias que vão além do lugar comum. Em todos esses contextos, uma constatação se repete: não é o orçamento que determina o avanço da saúde mental nas empresas — é a maturidade da gestão.
O que diferencia empresas maduras
Empresas maduras não tratam a saúde mental como cortesia ou reação a afastamentos em massa. Elas atuam antes da crise. Incorporam o tema à governança de risco, baseiam suas decisões em dados e ciência, promovem escutas qualificadas e integram o cuidado emocional à estratégia de negócios.
Essa prática tem respaldo internacional. O relatório Mental Health and Employers (Deloitte UK, 2022) mostra que organizações com uma abordagem estruturada obtêm retorno estimado de até £5 para cada £1 investido em saúde mental. Isso porque, nesses ambientes, o cuidado com a saúde emocional não é um benefício pontual — é parte da operação.
Outro dado relevante do Reino Unido: em 2023, o impacto econômico da má saúde mental no trabalho chegou a £51 bilhões, sendo £24 bilhões atribuídos ao presenteísmo — quando colaboradores estão fisicamente presentes, mas menos produtivos. Setores como finanças, tecnologia e transporte estão entre os mais afetados, com índices elevados de burnout. Só em finanças e seguros, 17% dos funcionários relataram sintomas, gerando um custo anual de £5.379 por empregado.
Setores em movimento
O setor de energia mostra um avanço concreto. Normas como a ISO 45001 e a 45003, que antes eram vistas como exigências técnicas, passaram a orientar também o cuidado com o bem-estar psicológico. O setor entende de inventário, plano de ação e indicadores — e levou esse repertório para o campo humano.
Na indústria, os riscos psicossociais estão começando a ser incluídos nos sistemas de saúde e segurança. Há variações de maturidade, mas o tema já está na pauta.
No setor financeiro, especialmente entre fintechs e grandes bancos, o discurso avançou rapidamente. Em alguns casos, há base técnica sólida e uso inteligente de dados. Em outros, as ações são mais simbólicas. A diferença aparece na durabilidade: onde há método, o cuidado sobrevive às trocas de liderança.
No setor público e educacional, o desafio é estrutural. Orçamento limitado, alta rotatividade e pouco suporte técnico dificultam a consolidação de estratégias. Ainda assim, surgem bons exemplos de escuta ativa, regulação e construção de diretrizes institucionais.
Maturidade: o que realmente importa
O McKinsey Health Institute, em relatório de 2023, reforça: ambientes psicologicamente saudáveis têm até 4 vezes mais chance de reter talentos e manter equipes engajadas. A falta de maturidade, por outro lado, custa caro — em produtividade, reputação e tempo.
O que temos visto é que a maturidade não está no tamanho do projeto, mas na forma como ele é tratado. Onde há clareza de papéis, envolvimento da liderança e disposição para integrar o cuidado à estratégia corporativa, os avanços são reais. Quando a saúde mental fica restrita a campanhas pontuais ou ações motivacionais, não resiste ao primeiro corte orçamentário.
A pergunta que fica
A saúde mental já entrou no discurso das empresas. A questão agora é: quem está realmente pronto para mantê-la como parte da estratégia?