Visão afiada: Saúde mental como estratégia, não emergência

Quando o problema é estrutural, a resposta precisa ser sistêmica.

Por Ana Carolina Peuker

Imagine como seria cortar uma árvore com o machado cego: não importa a força, o esforço vira desperdício. A lâmina bate, repica, desgasta e a árvore continua lá, enraizada.

No mundo corporativo, é o que acontece com quem tenta lidar com saúde mental só quando o problema já está instalado. Esperar o conflito escalar, os índices de afastamento e burnout estourarem, é como tentar cortar um tronco grosso com lâmina romba. Cansa, custa caro e não resolve.

Lideranças visionárias entendem que saúde mental não é só pauta de crise ou Iara atender a NR1. É estratégia de negócio. É cultura de longo prazo. É parte da sustentabilidade (humana) da operação.

Afie o machado. Isso significa se antecipar, mapear riscos, preparar lideranças. Não adianta correr atrás da cultura quando a norma bate à porta.

Tem quem ainda trate o tema como algo pontual, emergencial, periférico. Apesar disso, a floresta está crescendo: ambientes mais complexos, metas mais agressivas, sobrecarga digital, isolamento, insegurança psicológica. Não é mais questão de “se” a empresa vai lidar com isso; é “como” e “com que preparo”.

Não é uma crise isolada, episódica, é um estado. O adoecimento mental deixou de ser uma exceção e se tornou uma crise crônica no mundo do trabalho um sintoma estrutural de culturas que ainda operam no piloto automático

Afie o machado. Isso significa mapear riscos antes que eles explodam. Preparar lideranças para identificar sinais precoces. Implementar práticas consistentes, não só campanhas pontuais ou planos de gestão de riscos para atender norma.

O tempo de improviso passou. As empresas que enxergam saúde mental como ativo estratégico ganham mais do que clima bom; ganham tração, reputação e resiliência.

Trazer dados e tecnologia para guiar decisões, e, acima de tudo, tratar saúde mental com a seriedade que se dá a qualquer ativo estratégico.

Empresas que fazem isso não só reduzem afastamentos ou melhoram o clima. Elas ganham tração, atraem talentos, se blindam contra crises e constroem reputação. Trabalham com clareza, não na tentativa e erro.

O tempo de improviso passou. A floresta já está densa (basta olhar para os números. Os afastamentos por problemas de saúde mental cresceram 134% no Brasil, segundo Série SmartLab de Trabalho Decente, 2025.

Quem quiser abrir caminho vai precisar mais que força. Vai precisar visão. E, claro, um machado bem afiado.

Veja mais

Saúde mental e o risco invisível que as empresas não podem mais ignorar

Apesar do crescente reconhecimento da saúde mental como um fator crítico de sustentabilidade, CEOs e conselhos de administração ainda tratam o tema como periférico, emergencial ou meramente operacional — como se bastasse “atender à NR-1”. Há um desalinhamento evidente entre a percepção de cuidado e a real capacidade institucional de enfrentar, com inteligência estratégica, os […]

Maturidade em saúde mental exige lastro, não marketing

Nos últimos meses, tornou-se comum ver empresas e consultorias oferecendo “medições de maturidade em saúde mental”. Aparentemente, virou tendência. Poucos, no entanto, se perguntam: maturidade de quem? Com base em quê? O que se vê com frequência são diagnósticos que prometem muito, partem de pouco e chegam a lugar nenhum. Tentam medir sem ter construído […]

Quando o cuidado vira risco (e por que isso pode ser bom para todos)

Muita gente do RH ainda evita usar a palavra “risco” quando fala de saúde mental no trabalho. Prefere termos mais “leves”, como bem-estar ou engajamento. O problema é que essas palavras não têm força quando o assunto chega à mesa da alta gestão ou do conselho. Conselhos de administração tomam decisões baseadas em risco: o […]